sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Esmalte

Céu, tão grande é o céu

E bandos de nuvens que passam ligeiras

Prá onde elas vão, ah, eu não sei, não sei

E o vento que toca nas folhas

Contando as histórias que são de ninguém

Mas que são minhas e de você também(...)”

Dindi – Tom Jobim



Tereza estava farta de cebolas. Comia cebolas no desjejum, almoço e jantar. Antes de dormir, engolia um pedaço de cebola junto com um copo d'água. Para amenizar a acidez, por vezes, mergulhava-as numa solução de água com açúcar. Mas, nem assim, Tereza evitava a chuva.


Era tarde quando mirou-se no espelho. E percebeu o dilúvio. Esfregou, sofregamente, as costas da mãos sobre as pálpebras. Queria que elas fossem de borracha e a chuva de grafite. Mas seus olhos borravam com uma grossa argila negra. Devia ser a terra das cebolas que comia.


Era tão forte a chuva que seus joelhos já estavam cobertos pela água enlameada que aumentava furiosamente. Afastou-se de sua imagem sem olhar para trás e agarrou-se a sua arca de esmaltes. Segurou-a firmemente debaixo do braço e subiu na cadeira mais alta que encontrou. Posicionou-se sobre a mesa e despejou todos os seus vidrinhos. Escolheu sete cores que mais lhe agradaram e as enfileirou. Olhava-as à contraluz da janela da sala. Gostou do azul.


Preparou as unhas. Pingou uma gota de lágrima em cada uma. Era permitida apenas uma por dedo. Pingava, espalhava, esperava secar. Dedo a dedo, um por um, até chorar em duas mãos. As últimas dez contadas lágrimas das cebolas.


Agora era a vez do azul. Abriu o vidro, megulhou o pincel e deixou as viscosas gotas escorrerem para dentro do vidro. Limpava o excesso nas bordas do vidro e estendia as unhas para receber a cor. Primeiro a unha grande do polegar. Pintou cada canto, da base até a ponta, girava a falange para certificar-se de que cada espaço estava preenchido. Removia a tinta que grudava na pele com uma esponja embebida em vinagre.


Vieram depois o indicador, dedo médio, anelar e mindinho. Repetiu o mesmo processo com a mão direita.


Agora Tereza não ouvia mais os seus pingos de chuva. As lágrimas estavam cobertas pelo azul de seu arco-íris. A nova aliança da sua vida. Dançou suas mãos pelo ar. Imitou aves do céu com seus longos dedos. Sentia uma súbita alegria.


Encontrou na arca um esmalte furta-cor. Decidiu que ele combinava com o azul. E, assim, pintou, unha a unha, cada um de seus dez dedos.


Desceu da cadeira, correu pela casa. O solo estava seco, não precisava mais da arca. Roubou um último esmalte purpurina. Sentia uma divertida subversão preencher seus dedos.


Tereza estava farta de cebolas.


Decidiu plantar o céu em suas mãos.

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Texto escrito no dia 16 de Novembro de 2010.
Uma aliança com minha nova vida.
Para Mardônio França.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Como adquirir o livro


Car@s,

Muitas pessoas me perguntam como podem comprar o livro.
Infelizmente, (ainda!) não temos uma distribuição em massa e a nível nacional.
Mas, em Fortaleza, em algumas livrarias já está disponível:








* Lua Nova - em frente ao Shopping Benfica (http://tinyurl.com/2gyjr5j) - (85) 3214-5488
* Nobel - do Shopping via Sul - (85) 3278.6060 / 3278.1314

Em breve, também estaremos disponibilizando um sistema para compras pela internet e na livraria Siciliano (Del Paseo) e Livraria Cultura.

Por enquanto, a solução para os leitores de outra cidade permanece sendo o depósito em conta corrente e a remessa via correio. Interessados, mandem
e-mail para: katiushademoraes@hotmail.com

Saudações Poéticas!

Katiusha de Moraes

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Videopoema Asas - Mardônio França

Esse foi o videopoema inspirado no livro.

Direção: Mardônio França
Música: Bela Bartok
Trilha: Ícaro Mares e Stella Marina

Poesia tátil e comestível - Fábrica de Asas no SESC Iracema (21/09/10)























Ainda não encontrei as palavras para descrever o que aconteceu ontem.
Na ausência delas, uso as de minha mãe: "minha filha, só agora entendi o que o seu livro significa: ele tem cinco sentidos!"

Muito obrigada pela força de tod@s, em especial: Mardônio França (Corsário-(a)mor), Sesc Iracema (Elson, Fabiano de Cristo, Francisco e toda a equipe de produção), Selo Coletivo, Grupo Acesso, a turma que desenvolveu o Dispositivo Sensorial, Reginaldo Almeida (fotografias) e a Secult-CE, que acreditou no meu sonho desde o princípio.

Saudações Poéticas!










terça-feira, 21 de setembro de 2010

Sobre (re)nascimentos, o amor e a arte


Hoje, 21 de Setembro de 2009.
Uma data aleatória, longe de quaisquer ligações com meu mapa astral, nasce novamente Katiusha de Moraes.
Mas, dessa vez, nasço diferente. Nasço para uma nova existência. Para um caminho místico, para a arte. Ao lado de Mardônio França.
A Fábrica de Asas abrirá as portas novamente. A nau Corsária também volta ao mar.
É o firmar de um enlace.

E, em homenagem ao amor, segue um texto extraído de uma biografia de Dalí:

"(...) entre duas gargalhadas nervosas, Dalí confessa seu amor a Gala. Uma tarefa nada fácil para ele. Com efeito, Helena Devulina Diakanoff, filha de um advogado de Moscovo, a quem todos chamavam Gala, possuía um encanto fascinante, aliado a uma segurança que não deixava de impressionar o jovem Salvador. Este corpo tão próximo do seu, tão real, impedia-o de falar. 'A beleza frágil do rosto não era a única elegância desse corpo', diz-nos ele. Na fase da adolescência, Gala havia tido uma doença pulmonar. 'Olhava o seu andar orgulhoso de deusa da Vitória e dizia para mim mesmo, já com ponta de humor estético: 'Os rostos das deusas da Vitória são obscurecidos pelo mau-humor. Não lhes devemos tocar.' No entenat, eu ia tocá-la e apertar-lhe o corpo, quando a sua mão tocasse na minha. Era o momento de rir, e ri como um nervoso de tal modo violento que, naquele preciso momento, foi mais humilhante para ela. Mas Gala em vez de se sentir ofendida com o meu riso, ficou contente, Fazendo um esforço sobre-humano, apertou a minha mão ainda com mais força, em vez de a largar com desprezo, como teria feito qualquer mulher. A sua intuição de médium fê-la compreender o verdadeiro sentido do meu riso, tão inexplicável para os outros (...) e eu acabava de lho atirar aos pés e de fazê-la compreender o mais aterrorizador de todos os risos (...) Ela seria a minha Gradiva, a minha deusa da Vitória, a minha mulher. Mas para isso era preciso que me curasse. E ela conseguiu-o graças ao poder indomável e insondável do amor que sentia por mim, e cuja profundidade de pensamento e sagacidade prática ultrapassam os métodos psicanalíticos mais ambiciosos'".